sexta-feira, 19 de junho de 2009

Ética e Política

A ética é uma das grandes áreas em que se divide o pensar do ser humano desde os primórdios da filosofia, na Grécia Antiga. E desde essa origem a ética teve e tem uma íntima ligação com a política, chegando mesmo a uma quase identificação naquele momento da Antiguidade. É que ética é um conceito eminentemente ligado ao colectivo (ao social) seja esse colectivo a corporação (o caso das éticas profissionais), a nação ou a humanidade (onde se colocam todas as questões dos direitos humanos). Assim é que a filosofia política foi sempre tratada dentro do grande capítulo da ética que, com a física (e a metafísica) e a lógica, compunham o quadro geral da filosofia na Antiguidade.

O conceito de ética é também algo estreitamento vinculado ao sentimento dos povos, ao seu modo de viver e aos seus costumes, como indica a raiz grega da palavra (ethos), e tem naturalmente evoluído no seu conteúdo, como evoluem esses costumes ao longo do tempo e da história. As éticas de hoje são em vários aspectos profundamente diferentes das antigas, e a forma de encarar a escravidão é provavelmente o exemplo mais evidente dessas diferenças que abrangem muitos outros aspectos relevantes. Os antigos não conheciam, por exemplo, nenhuma ética da humanidade e um dos seus princípios de virtude era o de fazer o mal aos povos inimigos.

Quanto à política, a sua ideia desdobra-se em dois conceitos diferentes que convivem quotidianamente na opinião dos cidadãos e na motivação da acção dos políticos: um é o de que a política, a mais nobre das ocupações humanas, é o empenho na realização do bem comum, do bem da colectividade ao qual se aplica como a um propósito final; é a concepção de Platão e de Aristóteles, dos filósofos gregos que a explicitaram na sua polémica de afirmação da filosofia (que se confundia para eles com a política), contra o pragmatismo dos sofistas e dos retóricos que ensinavam a linguagem eficaz para o manejo das assembleias e das funções políticas. O outro é o de que a política é a arte e a sabedoria de conquistar e de manter estável o poder; o fazer o bem, nesta visão, não é propriamente um fim, mas um meio de ganhar o apoio dos cidadãos para a conservação e a estabilização do poder, empregado em paralelo com outros meios também válidos, como o marketing, o controle dos media, o clientelismo, o populismo e até mesmo a mentira, a violência e a corrupção. Este é o conceito derivado das interpretações mais correntes dos conselhos de Maquiavel e é o que melhor se enquadra nas concepções da ciência política moderna, entendida a ciência como conhecimento neutro, isto é, destacado de qualquer consideração de natureza ética.

Relações de Conflito

Um primeiro campo de relacionamento, que tem sempre suscitado mais interesse nas especulações e nos debates que se travam sobre o tema, é o dos conflitos entre os principias da ética e a realidade da política.

Assim, ética e política sempre tiveram uma intensa relação dialéctica de conflito, na convivência, variando os termos e os temas desse confronto. Entre esses temas, sempre se ressaltou o da mentira política, como uma espécie de agressão mais aceitável aos princípios morais. Platão, por exemplo, dava aos médicos e aos políticos o direito ao uso da "mentira útil", aquela capaz de agir como um fármaco sobre os indivíduos e sobre a Pólis em estado de doença. Modernamente, a polémica da mentira e da verdade tem-se situado em torno do conceito da "razão de Estado" que se originou nas relações de diplomacia entre os Estados monárquicos e se estendeu às relações governantes-súbditos, significando projectos e informações que tinham de ser mantidos em segredo nos círculos mais íntimos do poder.

A dialéctica da política com a mentira tem ainda outras áreas de contacto, a actividade política necessariamente tem uma dimensão que é o "fazer imagem", construir e cultivar a imagem do líder, a imagem do candidato, a imagem do partido, algo que fácil e correctamente escorrega para o "forjar a imagem", com o sentido de forçar os limites da verdade, e se confunde frequentemente com a impostura e a mentira útil para o forjador. É sabido que a política lida muito com "versões", e não tanto com verdades científicas, cujo estabelecimento é missão da história, com seus métodos e sua perspectiva de tempo.

O entendimento que compatibiliza esses conflitos da ética com a política é o de que ambos os conceitos têm tudo a ver com a vida humana, com o Ser do homem em sociedade, e este Ser recusa qualquer tipo de enclausuramento dentro de princípios absolutamente rígidos. Se a moral, no âmbito do indivíduo, admite margens de flexibilidade no que respeita aos seus princípios, a ética, que preside as acções na perspectiva da colectividade, invoca tantas vezes a razão, atributo essencial desse Ser, a fim de validar margens de tolerância para as acções políticas, sem que tenha de renunciar ou abrir mão de seus princípios, simplesmente flexibilizando-os. (Texto Adaptado)

http://www.cfm.org.br/bancotxt/des_etic/3.htm

Fonte: http://www.espanto.info/f10ner/f21.htm

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