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sexta-feira, 23 de abril de 2010

Conversa com André Comte-Sponville

Entre o luxo e a justiça

Essa é a escolha que a nossa geração deverá fazer para salvar o planeta, afirma o pensador francês

por Carol Bensimon | design Márcio Fujii

Nascido em Paris, em 1952, André Comte-Sponville é autor de uma obra filosófica descomplicada e bastante popular na França e fora dela, na qual ele transita por temas clássicos, como o amor e a felicidade, e as urgências da vida contemporânea. Em um de seus livros mais célebres, O Capitalismo É Moral?, o filósofo discute a relação, ou melhor, a falta de relação entre ética e economia. Montaigne, Espinoza e Epicuro estão entre as maiores influências do filósofo. Ateu declarado, Comte-Sponville não renega, no entanto, a educação católica recebida durante a infância e a adolescência, e suas obras estão carregadas de referências ao budismo e a outras religiões orientais, das quais ele diz ser grande admirador. O que parece contraditório à primeira vista pode ser resumido assim: o pensador francês é partidário de uma espiritualidade que pretende ir além das religiões e da crença em Deus, pensamento que ele expõe na obra O Espírito do Ateísmo. André Comte-Sponville já foi professor da Sorbonne, mas hoje dedica-se exclusivamente a seus livros e às palestras que ministra.

Para ter a consciência tranquila, há muita gente disposta a pagar mais caro por produtos menos agressivos ao ambiente. A moral se tornou um argumento de venda?

Um pouco mais complexo que isso. O que eu digo é que a economia não é moral. Isso não quer dizer que a moral não tenha qualquer relação com a economia, mas que essa relação passa exclusivamente pela consciência dos indivíduos. A prostituição, por exemplo, é uma troca de ordem comercial. Isso não quer dizer que ela seja moralmente inocente. Por outro lado, se você compra produtos com o selo “Comércio Justo”, sua moral intervém na economia. Mas então não é o mercado que é moral, é você. A mesma coisa acontece com a dita onda ecológica. Há aí um fenômeno de moda, é claro, mas há também um problema de verdade, que é moral: que planeta queremos deixar para nossos filhos? Que a ecologia tenha virado um argumento de venda para as empresas, isso não impede que ela seja também uma exigência moral para os indivíduos!

Se todos pudessem ter os hábitos de consumo de um europeu médio, o resultado seria desastroso para o meio ambiente. A desigualdade é necessária para a manutenção do planeta?

Não é a desigualdade que é necessária. Se todos os seres humanos tivessem, por exemplo, o mesmo nível de vida de um africano médio, o planeta estaria muito melhor. O que é incompatível com a sustentabilidade do planeta não é simplesmente a igualdade, mas a igualdade na abundância e no luxo. Então será preciso escolher, em algum momento, entre o luxo e a justiça, entre a abundância e a sobrevivência. Esse é o problema do desenvolvimento sustentável, sem dúvida a questão política mais importante da atualidade.

A felicidade é um tema recorrente em sua obra. No que a filosofia pode ajudar na busca por ela?

Em primeiro lugar, ajudando a compreender o que ela é. E o que é a felicidade? É o contrário da tristeza. É preciso partir daí. Ora, e o que é a tristeza? Todo período, para um indivíduo, no qual parece impossível sentir-se alegre. Levantamos de manhã e sabemos que não nos sentiremos felizes nem uma vez durante o dia, às vezes acreditamos até mesmo que não nos sentiremos felizes nunca mais… Aqueles que passaram por isso conhecem o peso do horror, do desgosto, do sofrimento. E eles sabem também, por oposição, que a felicidade existe. O que é a felicidade? Certamente não é uma alegria contínua e estável. Isso não existe, é somente um sonho que nos afasta da felicidade. A felicidade é o contrário da tristeza: sou feliz quando tenho a sensação de que a alegria é imediatamente possível, que pode aparecer de um momento a outro, que ela talvez já esteja aqui, claro que não de maneira permanente, mas com essa facilidade, essa espontaneidade, essa leveza que torna a vida agradável. A felicidade não é algo absoluto, mas como é bom!

E o que pode fazer as pessoas se sentirem felizes?

Nenhum aspecto externo é suficiente: nem o dinheiro, nem o sucesso, nem o poder, nem a família, nem mesmo o fato de ser amado por fulano ou beltrano. A miséria, por exemplo, pode ser suficiente para a tristeza, mas todos sabem que ser rico nunca foi suficiente para ser feliz. A felicidade depende de uma disposição interior. Qual? A que os antigos chamavam de “sabedoria”, e que nós poderíamos chamar, de forma mais simplificada, amor à vida. E eu estou dizendo “amor à vida”, feliz ou infeliz, e não à felicidade. Qualquer um é capaz de amar a felicidade. Mas, se é a felicidade que você ama, você só estará contente com a vida quando estiver feliz, e quanto mais você for feliz, maior será seu medo de não o ser mais. Por outro lado, se você ama a vida, você tem uma excelente razão para viver e para lutar, mesmo quando a felicidade não está lá.

Na sua opinião, quais são hoje as grandes questões contemporâneas que devem aparecer na filosofia?

A maioria das grandes questões filosóficas são mais eternas que contemporâneas: a questão do ser, a de Deus ou de sua inexistência, a vida, a morte, a liberdade, o amor, a moral, o conhecimento, o tempo, a justiça, o poder, o trabalho, a felicidade, a sabedoria… o suficiente para ocupar uma vida! O que não impede o interesse pelas questões atuais. Em primeiro lugar, porque essas questões eternas devem chegar, hoje, a respostas que convenham à nossa época. E também porque há novas questões que surgem e que é preciso enfrentar. As principais me parecem ser a do desenvolvimento sustentável, da bioética e da globalização (sobretudo no aspecto cultural). Além disso, é preciso repensar a questão política: levar em conta o fracasso do marxismo, sem desistir, no entanto, de transformar a sociedade.

Para saber mais

Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, Martins Fontes O Capitalismo É Moral?, Martins Fontes

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Justiça social

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A justiça social -

Presentation Transcript

  1. O Indivíduo e o Estado A justiça social: três perspectivas
  2. Aristóteles: o homem como animal político. Segundo Aristóteles, o homem é um animal político: A Pólis (a cidade/a sociedade), o Estado, é algo de necessário à natureza humana, pois o homem, enquanto indivíduo, só se realiza plenamente em sociedade e a sua existência seria impensável sem ser em sociedade. A própria racionalidade que diferencia o homem dos restantes animais só se pode afirmar em diálogo, em confronto, em partilha...
  3. “A razão pela qual o ser humano, de forma mais intensa do que uma abelha ou qualquer outro animal gregário, é, plenamente, um animal político, é evidente: a natureza não faz nada por acaso, e só o homem é um animal que possui Lógos (Palavra; Razão). Assim como as vocalizações dos animais indicam o prazer e o sofrimento, o discurso serve para indicar aquilo que tem utilidade. É que, em comparação com os outros animais, o homem tem as suas especificidades: tem noção do bem e do mal, do justo e do injusto; e são estes sentimentos que dão origem à família e à Pólis.” Aristóteles, Política, 1253a
  4. “Visto que todas as cidades são associações e que toda a associação se forma com vista a algum bem (porque os homens quando agem visam sempre alcançar o que lhes parece ser um bem), daqui se conclui que, se as associações visam um bem, aquela que é mais importante e que engloba todas as demais é a que visa o bem mais importante; ela designa-se como 'cidade' (Pólis), ou comunidade política.” Aristóteles, Idem.
  5. Tal como se passa em relação ao corpo humano, em que cada parte existe e só tem sentido na sua relação com o todo: “O mesmo se passa com os membros de uma Cidade, nenhum é auto- suficiente. Quem não sentir necessidade de viver em sociedade, não será um homem, mas um animal ou um deus. A própria natureza conduz cada um dos homens a este tipo de associação.” Aristóteles, Idem.
  6. Síntese: Para Aristóteles, o estado natural do homem é a vida em comunidades políticas (cidades/estados). A Justiça é uma virtude, pertencendo, portanto, ao campo da ética. Só pela educação e pela melhoria da consciência ética dos cidadãos se poderá instituir uma sociedade justa, de acordo com o modelo aristotélico. O objectivo principal da ética aristotélica é a felicidade e neste sentido, a comunidade política, a Cidade, é um instrumento fundamental para a obtenção da felicidade, não podendo ser um obstáculo à obtenção da felicidade por parte de cada um dos cidadãos. A autoridade do Estado é natural, bem como a legitimidade das leis. Para Aristóteles, as mulheres, as crianças, os estrangeiros e os escravos, devido à sua condição natural, não eram cidadãos. “Assim como o homem civilizado é o mais excelente dos animais, também aquele que não conhece nem leis, nem justiça é o pior de todos.” Aristóteles
  7. John Locke: o Estado contratualista Para John Locke, existe um estado de natureza em que os homens podem viver sem estarem submetidos à autoridade do Estado. Esse estado de natureza é anterior à constituição da sociedade civil. A sociedade civil constitui-se com base num contrato social livremente estabelecido entre os cidadãos, de acordo com o qual cada um dos indivíduos abdica de parte da sua liberdade natural para se submeter ao império da lei e da autoridade do Estado.
  8. No Estado de Natureza o indivíduo está na posse plena da sua Liberdade Natural e mesmo que viva em associação com outros indivíduos (em famílias ou tribos), não há nada que se sobreponha à vontade individual, nem nenhum poder a que os indivíduos possam recorrer se a sua segurança for ameaçada. Mesmo assim, os indivíduos no Estado de Natureza são portadores de direitos (o direito à vida, a liberdade e à propriedade) e de deveres (de respeitar a vida/a saúde, a liberdade e a propriedade dos outros), de acordo com a Lei Natural instituída por Deus. Mas não há qualquer instância que faça respeitar esses direitos e restabeleça a justiça de forma imparcial, caso existam transgressões. Por isso os indivíduos preferem associar-se de forma a constituírem sociedades civilizadas, onde a autoridade do Estado possa garantir a segurança, o gozo dos direitos naturais e a justiça. O Estado é o garante da justiça social, pois assume- se como um poder superior à vontade individual, capaz de fazer respeitar os direitos individuais, quer através da formulação de leis, como através da execução de mandatos e da aplicação da justiça.
  9. John Rawls: a justiça como base da estruturação das sociedades
  10. Rawls é contratualista: Na base da constituição das sociedades está um acordo feito entre hipotéticos fundadores que, ao estabelecerem os princípios basilares da estruturação da sociedade, estão sujeitos ao que Rawls chama o “véu da ignorância”, ou seja, instituem a sociedade sem saberem quais as condições a que a sociedade irá estar sujeita no futuro. E nesse sentido, esse “véu da ignorância” garante a equidade da actuação dos fundadores, pois estes desconhecem qual o seu estatuto e quais os seus interesses no seio da sociedade. Daí a sua actuação ser justa e imparcial. Embora esta situação seja meramente hipotética, servindo de base à legitimação das decisões constituintes que são tomadas sempre que os poderes políticos fazem as leis e instituem deveres e direitos (os agentes do Estado colocam-se no lugar desses hipotéticos fundadores), a ideia que está na sua base está ligada à forma como os Estados Unidos da América se instituiriam como um país independente. Na América os “pais fundadores” são uma referência sempre que se discutem direitos, liberdade e garantias dos cidadãos.
  11. Rawls defende uma concepção de justiça que obedece ao seguinte: todos os bens sociais primários — liberdades, oportunidades, riqueza, rendimento e as bases sociais da auto-estima — devem ser distribuídos de maneira igual a menos que uma distribuição desigual de alguns ou de todos estes bens beneficie os menos favorecidos.
  12. Rawls defende que a sua concepção de justiça assenta nos seguintes princípios: Princípio da liberdade igual: A sociedade deve assegurar a máxima liberdade igual para cada pessoa compatível com uma liberdade igual para todos os outros. Princípio da diferença: A sociedade deve promover a distribuição igual da diferença riqueza, excepto se a existência de desigualdades económicas e sociais beneficiar os menos favorecidos. Princípio da oportunidade justa: As desigualdades económicas e sociais justa devem estar ligadas a postos e posições acessíveis a todos em condições de justa igualdade de oportunidades.
  13. Estas concepções acerca da justiça social e da organização política das sociedades permitem enfrentar os problemas que afectam o mundo contemporâneo? Aristóteles, Locke e Rawls, apresentam teorias muito diferentes e podemos pensar que não há nada em comum entre elas, ou que de Aristóteles até Rawls há uma evolução em direcção a uma concepção mais humana do Estado e das relações entre os indivíduos no seio da sociedade civil.
  14. No entanto, hoje vivemos num mundo cada vez mais globalizado e enfrentamos problemas que exigem medidas globais. A civilização Ocidental privilegiou, ao longo da sua história, uma concepção de sociedade encarada como um todo isolado do exterior, entre muralhas e fronteiras, com um conjunto de instrumentos bélicos e de repressão interna. Talvez hoje faça mais sentido falar numa cidadania global que reconheça cada ser humano como um cidadão do mundo, com o direito a viver onde quiser e a ver a sua dignidade respeitada em qualquer parte do mundo...
  15. Mas este ideal ainda parece muito longínquo: Vivemos num planeta dividido em dois blocos separados por um fosso aparentemente intransponível: o hemisfério sul vive mergulhado na fome e no desespero, enquanto que o hemisfério norte, principalmente na sua vertente ocidental, detém uma riqueza nunca antes vista; enquanto nos países do sul milhões de pessoas morrem de fome e de doenças facilmente evitáveis, no norte destroem-se toneladas e toneladas de alimentos que são produzidos em excesso e não têm quem os compre...
  16. Esta situação é sustentável? É aceitável? Pode haver justiça social dentro de cada um dos estados, sem que o mundo seja mais justo?
  17. O que é que cada um dos outros seres humanos é a mais ou a menos do que nós?
  18. A pobreza aqui... ...ou em qualquer parte do mundo É aceitável?
  19. O sol nasce para todos?
  20. www.espanto.info

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